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segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Os miúdos e os desenhos animados: quando a realidade e a fantasia são a mesma dimensão

(texto escrito por Rita Castanheira Alves, Psicóloga Clinica do Psicóloga dos Miúdos)

Foto encontrada no Pinterest - bestfriendmemories.blogspot.com
Eu faço, eu corro, eu voo, eu salvo, eu destruo, eu agarro, eu atiro-me.
Eu sou um Menino Super-Herói!

Mas, e se o seu filho se lembra de se transformar em Super-Herói a atravessar a estrada?
Aposto que se é mãe ou pai fica logo sem qualquer poder especial.

A verdade é que, atualmente, com o impacto e com a forte presença da televisão, com a evolução da tecnologia, que permite melhor som, maior e imagem mais real, e com o aumento da quantidade e diversidade de desenhos animados e jogos electrónicos, a realidade e a ficção estão lado a lado, quase em risco de, ainda que por momentos, se fundirem ou baralharem. Ainda mais quando falamos de crianças.

Alguns pais contam que se assustam com esta confusão ou dificuldade dos filhos em separar a realidade da ficção e, por momentos, se esquecerem que Super-Heróis só existem nas histórias. Porque largou a mão e atravessou a estrada a correr: “ - Estava a imaginar que era um Super-Herói com o poder da velocidade e nenhum carro me conseguiria bater.”; porque subiu para cima do armário e queria lançar-se: “- Sou um menino com asas, consigo voar e tenho que saltar para ir salvar os bons!”; ou porque começou a escalar a estante cheia de livros e objectos pesados:
“- Tenho o poder das teias, como o homem-aranha.”

São estes alguns dos exemplos que fazem os pais sentirem-se ansiosos e com vontade de ter super poderes e convencer os filhos a não saírem da realidade.

Para percebermos melhor o que acontece, podemos organizar-nos por idades. Até certo momento a criança não consegue ainda distinguir no que vê, o que é real do que é fantasia. Pode ver na ficção algo que pensa ser real, vivendo-a de forma intensa. Este tipo de comportamento é típico a partir dos 3 até aos 6 anos. É nesta altura que, em simultâneo, o pensamento mágico e a imaginação estão fervorosos, fazendo com que alguns meninos se esqueçam da realidade e passem a agir como se aquilo que estão a imaginar fosse real.
Podem mesmo zangar-se com o que imaginam ou ficar tristes.

Mais tarde, por volta dos 6 anos, as crianças começam a distinguir o real da ficção, aquilo que é verdade do que é a fingir. No entanto, poderão viver intensamente a história que estão a acompanhar, ter um personagem favorito e imitá-lo, ainda que distingam que é só na brincadeira, dizendo por vezes: “- Agora a fingir que…”

É a partir dos 10 anos que, por serem mais crescidos, poderão ser menos monitorizados pelos adultos e por isso aceder a conteúdos que poderão não ser para a sua idade e, como tal, ter acesso a outro tipo de ficção, em que o herói pode ser menos simpático do que nos desenhos animados e na realidade correrem perigo, por arriscarem e quererem ser como esse herói, embora saibam que é um filme. No entanto, por vezes, ao acederem a filmes com pessoas reais, a noção de ficção pode por vezes fundir-se com a realidade.

Então o que fazer quando o meu filho pensa que é um Super-Herói ou se esquece, à beira da estrada, que está na dimensão da realidade e não do imaginário?

É importante monitorizar, acompanhar e falar sobre o que viu, o que assimilou e desenvolver com o seu filho, o espírito crítico. Antes dos 6 anos, reforçar alguns cuidados, pela maior dificuldade em separar a ficção da realidade e por se inundarem de fantasia num piscar de olhos. É essencial desenvolver com ele pequenas tarefas de autonomia, de atenção. Por exemplo, manter a mão dada quando saem de casa e ir conversando sobre o que vos rodeia, mantendo uma atitude presente e focada, no aqui e no agora, questionando-o sobre se poderão atravessar, onde devem andar, onde vão, quantos passam dão, que sons ouvem e o que mais se lembrar que o ajude a ter uma atitude presente, a que podemos chamar mindful.

O “momento da televisão” deve ser vigiado e acompanhado, ainda que não tenha de estar sempre ao lado do seu filho. No entanto, pode perguntar-lhe o que esteve a ver e conversarem sobre isso, para que possa ajudá-lo a distinguir realidade de ficção.

Criar momentos de fantasia, entrando nas histórias imaginadas que ambos podem criar e nesses momentos há espaço para toda a ficção. Permitir que haja espaço e tempo específicos para a total brincadeira e imaginação, sem limites, fará com que no momento de estar na realidade, o seu filho esteja mais atento.

Ter alguma calma e paciência. Os miúdos crescem e com o tempo afastam-se mais da ficção e da fantasia. Que adulto não continua a gostar, de vez em quando, de fugir para a fantasia e imaginar que voa por cima de uma gigante fila de trânsito? Ou que é uma mulher cheia de força que enfrenta o chefe e lhe diz tudo o que já pensou dezenas de vezes?

Criar, imaginar, fantasiar, ajuda também a crescer e a experimentar identidades, especialmente nas idades mais precoces. Permita que esse lado de fantasia exista, tomando as precauções necessárias e ajudando a que, lado a lado, realidade e ficção possam existir, evitando perigos maiores mas permitindo que a realidade séria e objectiva não seja a única a existir.


Rita Castanheira Alves
Psicóloga dos Miúdos
Psicologia Clínica Infantil e Juvenil e Aconselhamento Parental
Facebook: https://www.facebook.com/pages/Psicóloga-dos-Miúdos/501952713274920?fref=ts

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

“Desconfio que ser irmão mais velho não é assim tão fixe…"


(texto escrito por Helena Almeida, psicóloga clínica da Equipa Mindkiddo, da Oficina de Psicologia)

Infografia de Inês Carvalho, Psicóloga Clínica da Oficina de Psicologia

Ah! A perspicácia dos mais novos! Sempre a surpreender!

Esta é a história do Manuel, 5 anos, campeão do berlinde, filho (até agora) único e, como de certo concordarão comigo no final da história, exímio nas deduções.

O Manuel está no pré-escolar e so far… so good. A vida corre-lhe bem: tem a maioria dos jogos que quer para a sua consola de eleição, o tablet e o telemóvel da mãe, governa o reino da sala tendo como súbditos a televisão e o sofá (pelo menos até às 21h e 30m…), espalha os brinquedos confortavelmente pela casa e recolhe-os a seu belo prazer, goza de um quarto só seu e (apesar de não gostar que se saiba) tem regalias de cama dos pais nos preguiçosos domingos de manhã, tem toda a atenção que deseja “na hora”… e nada parecia ameaçar este feliz viver… até que…

“vamos ter um mano!”

A notícia apanhou-o de surpresa! Nem sabia o que pensar. Seria bom? Seria mau? 

Bem, depois do difícil processo de negociação para ter um animal doméstico e das cedências sucessivas que resultaram na aquisição do peixinho dourado (e não no labrador proposto inicialmente), a apresentação deste facto consumado sem a necessária reunião das partes interessadas não lhe pareceu bem.

Por outro lado, um irmão até seria fixe. Teria sempre alguém com quem brincar, poderia duplicar o número de jogos disponíveis, jogar às escondidas com alguém que de facto se conseguisse esconder lá em casa (o pai escondido atrás dos cortinados não era grande desafio…).

SIM! UM MANO! BOA!

Foi com grande entusiasmo e excitação que o Manuel abraçou este projeto: foi à ecografia com a mãe, participou na escolha do nome do mano, ajudou os pais a ir buscar a sua roupa de bebé à arrecadação e selecioná-la por tamanhos… e foi aqui que começaram os problemas…

“Tão pequenino?! Não vai sequer ser capaz de pegar no comando da consola quanto mais jogar!”, “Uhm? Comer e dormir? É isso que eu posso esperar do mano? Não me parece muito…”, “Bem, há-de crescer… que seja rápido!”

O nascimento do mano aproximava-se e os preparativos sucediam-se a uma velocidade vertiginosa. A mãe andava cansada, já nunca brincava às escondidas e jogar à bola nem pensar. A família (crescidos) visitavam e traziam prendas para o bebé e iam dizendo:
“vais ter de ajudar a mãe…”, “tu já és crescido, e o bebé vai precisar muito da mãe e do pai…”, “depois tens de partilhar os teus brinquedos…”


“O quê? Não foi nada disto que combinámos! Então a ideia não era um mano para eu brincar? Agora é que me dizem que vai haver trabalho para mim, menos mãe e pai e ainda por cima menos brinquedos?!”

Vendo o Manuel entristecido a mãe foi falar com ele, que lhe explicou o que se passava e como andava preocupado. A mãe ouviu com atenção, e tranquilizou o Manuel explicando que era justo que se sentisse triste, confuso e cansado de todas estas mudanças e diligências. Se calhar precisava de mais tempo para estarem com ele…

Os pais sentaram-se os dois a pensar como poderiam ajudar o Manuel, e depois de recolherem conselhos e sugestões, lerem e pesquisarem chegaram a esta lista:

1.             Explicar o que pode o Manuel esperar do mano a cada momento do seu desenvolvimento;

2.             Explicar ao Manuel as necessidades do bebé e porque é que ele precisa tanto dos adultos;

3.             Explicar que é natural que os pais se sintam mais cansados;

4.             Combinar de que forma é que o Manuel também pode ajudar o bebé e os pais (ajudar a dar banho, a mudar as fraldas…);

5.             Fazer o Manuel sentir que ser o mais velho é um posto importante e não um castigo!;

6.             Elogiar e reforçar o Manuel por todos os comportamentos positivos!

7.             Combinar um tempo diário divertido só para o Manuel;

8.             Manter o mais possível as nossas rotinas e rituais de família (jantar juntos, ler uma história antes de dormir, jogar às escondidas!);

9.             Envolver o Manuel em todos os preparativos, pedir a sua opinião e validar os seus contributos;

10.          Ter em mente que o Manuel também precisa de tempo para falar só dele e das suas emoções, de fazer projectos só seus e em que nós estejamos envolvidos (sem bebé);

11.          Explicar que o amor de pais não se divide, multiplica-se!

ps: dizer ao Manuel que, afinal, é uma mana…


Helena Almeida, Psicóloga Clínica da Equipa Mindkiddo
(Mestrado Integrado em Psicologia – Área de Clínica, Instituto Superior de Psicologia Aplicada (2012); Licenciatura em Ensino Básico 1.º Ciclo, Escola Superior de Educação de Lisboa (2004)

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Será que o meu filho tem, ou vai ter, ansiedade de separação?

(texto escrito por Rita Castanheira Alves, Psicóloga Clínica Infantil e Juvenil)


A ansiedade de separação é uma característica que faz parte do desenvolvimento infantil e refere-se às preocupações da criança relativamente à perda dos pais e/ou das figuras de referência na sua vida. Enquanto característica de desenvolvimento adaptativa, porque ajuda a criança a proteger-se de estranhos e a pedir a aproximação dos pais ou das figuras de referência, tende a desaparecer.

Só que por vezes a ansiedade de separação que seria esperada torna-se excessiva e prejudicial na vida da criança. Nesses casos, pode-se estar perante uma Perturbação de Ansiedade de Separação.

A perturbação de ansiedade de separação pressupõe na sua essência uma ansiedade excessiva e prolongada relativamente à separação de casa ou daqueles a quem a criança está ligada.

E como sei que o meu filho pode ter uma perturbação de ansiedade de separação? Há sinais de alerta?

As crianças que estão a vivenciar esta perturbação podem exibir alguns dos seguintes sinais durante, pelo menos, 1 mês:

- Um mal-estar excessivo quando antecipam ou ocorre a separação de casa ou de figuras de maior vinculação;

- Preocupação excessiva pela possível perda das principais figuras de vinculação ou por possíveis males que possam acontecer a essas pessoas;

- Preocupação excessiva com a possibilidade de que um acontecimento adverso possa levar à separação de uma importante figura de vinculação;

- Resistência persistente ou recusa em ir à escola ou a outro local, por medo da separação;

- Uma resistência ou medo persistente e excessivo em estar em casa sozinho ou sem as principais figuras de vinculação ou, noutros locais, sem adultos significativos;

- Recusa em adormecer sem estar próximo de uma importante figura de apego ou em adormecer fora de casa;

- Pesadelos repetidos que envolvem o tema da separação;

- Queixas repetidas de sintomas físicos (como dores de cabeça, dores de estômago, náuseas, vómitos) quando ocorre ou se antecipa a separação em relação a figuras importantes a quem está muito ligado.

E que motivos leva a que a angústia de separação normativa se possa transformar em perturbação?

São diversos os motivos que estão na origem e na manutenção da perturbação da angústia de separação, entre eles:

- Grande instabilidade familiar;

- Dificuldades sérias e prolongadas de adaptação a novos contextos (como entrada no Jardim-de-Infância);

- Mudanças bruscas e excessivas na vida da criança;

- Ansiedade excessiva dos pais/cuidadores, criando contextos de desenvolvimento de superprotecção e menor autonomia para as crianças;

-  Permissividade excessiva e contextos de exigência excessiva de autonomia e de independência.

E há soluções? Como posso ajudar o meu filho?

Há. Em primeiro lugar respirar com a maior tranquilidade possível com a certeza de que há soluções:

- A diminuição da ansiedade por parte das figuras parentais e outras figuras significativas é essencial para que a própria criança se sinta segura e confiante;

 Transmita-lhe confiança, um contexto tranquilo, com rotinas e regras;

- Tente perceber o que poderá estar na origem da ansiedade de separação e o que a está a manter e procurar solucionar se assim for possível;

- Ajude a criança a sentir-se capaz de enfrentar o que teme e ajude-a a gerar estratégias para lidar com o que está a sentir;

- Mostre-lhe, gradualmente, que consegue ficar sozinha e que a mãe/pai irão sempre voltar para a buscar onde quer que ela esteja;

- Sempre que a deixar no Jardim-de-Infância ou outro lugar não desapareça de imediato, dê-lhe um beijinho ou um abraço de despedida, dizendo-lhe tranquilamente que voltará no final do dia;

- Os momentos que passarem juntos procure que sejam de tranquilidade, alegria e de atenção à criança;

- Lembre-se da sua própria ansiedade e de como é importante que a tente controlar;

- Se precisar de apoio não hesite em contactar um psicólogo infantil. Poderá ser essencial para que possa, da melhor forma possível, superar com o seu filho esta situação.

  
Rita Castanheira Alves
Psicóloga dos Miúdos
Psicologia Clínica Infantil e Juvenil e Aconselhamento Parental

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Eu quero, posso e mando.

(texto escrito por Maria João Matos, psicóloga clínica da Oficina de Psicologia)

Foto: momjunction.com

Eu quero, posso e mando.

Esta é uma expressão comum no discurso de algumas crianças e adolescentes, à qual alguns pais assistem sentindo-se incapazes de atuar, e permitindo que continue a fazer parte do vocabulário dos filhos.

É certo e sabido que os pais definem, desde o nascimento dos seus filhos, regras e limites. Apesar de esta ser uma matéria apreendida por todos, deparamo-nos com uma situação de fragilidade nas famílias, perfeitamente detetada no crescimento dos mais novos lá de casa.

Crianças que crescem num registo de “eu quero, posso e mando”, acabam muitas vezes por “tiranizar” os pais, invertendo a autoridade e acatando sérios riscos na vida pessoal, escolar e social.

Vivemos numa sociedade em que cada vez mais se apela à noção do “sem limites” ou do “prazer total”, parecendo esta dificultar os pais no exercício do seu papel, gerando uma incapacidade na implementação de regras e limites no dia a dia dos filhos.

Assistimos a inúmeros pais que se queixam que os filhos estão constantemente a fazer pedidos, aos quais acabam por aceder continuamente, abdicando eles próprios de satisfazer algumas necessidades, por incapacidade de fazer parar este ciclo. Situações deste género contribuem de forma séria para que os papéis parentais se diluam e se confundam. 

São exemplos destas situações pais e filhos muito próximos, que dizem ser os melhores amigos e confidentes, e pais que não dizem Não aos filhos e que acatam quase indiscriminadamente todos os seus pedidos. Deste modo, acabam por ser vítimas de um consumismo, que gera um vazio e uma confusão total. Por sua vez, este vazio e confusão é, na maior parte das vezes, preenchida através do consumo.

Mas porquê continuar a persistir na ausência de um modelo de educação virado para valores que os filhos tanto necessitam, para que sejam adultos emocionalmente estáveis?

Porque é que existem tantos pais a fazê-lo?  Porque parece tão difícil de implementar, se todos conhecem as consequências?

Vale a pena reflectir sobre isto, sem acusações ou sentimentos de culpa.

A atenção, o tempo, a disponibilidade genuína e o afeto, podem funcionar como o reverso da moeda do consumo, do vazio e da confusão, isto é, da ausência de regras e limites.
                  
                                                                                                                                                                                  Maria João Matos
Psicóloga Clínica
Equipa Mindkiddo- Oficina de Psicologia
                  

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