segunda-feira, 3 de novembro de 2014

“Desconfio que ser irmão mais velho não é assim tão fixe…"


(texto escrito por Helena Almeida, psicóloga clínica da Equipa Mindkiddo, da Oficina de Psicologia)

Infografia de Inês Carvalho, Psicóloga Clínica da Oficina de Psicologia

Ah! A perspicácia dos mais novos! Sempre a surpreender!

Esta é a história do Manuel, 5 anos, campeão do berlinde, filho (até agora) único e, como de certo concordarão comigo no final da história, exímio nas deduções.

O Manuel está no pré-escolar e so far… so good. A vida corre-lhe bem: tem a maioria dos jogos que quer para a sua consola de eleição, o tablet e o telemóvel da mãe, governa o reino da sala tendo como súbditos a televisão e o sofá (pelo menos até às 21h e 30m…), espalha os brinquedos confortavelmente pela casa e recolhe-os a seu belo prazer, goza de um quarto só seu e (apesar de não gostar que se saiba) tem regalias de cama dos pais nos preguiçosos domingos de manhã, tem toda a atenção que deseja “na hora”… e nada parecia ameaçar este feliz viver… até que…

“vamos ter um mano!”

A notícia apanhou-o de surpresa! Nem sabia o que pensar. Seria bom? Seria mau? 

Bem, depois do difícil processo de negociação para ter um animal doméstico e das cedências sucessivas que resultaram na aquisição do peixinho dourado (e não no labrador proposto inicialmente), a apresentação deste facto consumado sem a necessária reunião das partes interessadas não lhe pareceu bem.

Por outro lado, um irmão até seria fixe. Teria sempre alguém com quem brincar, poderia duplicar o número de jogos disponíveis, jogar às escondidas com alguém que de facto se conseguisse esconder lá em casa (o pai escondido atrás dos cortinados não era grande desafio…).

SIM! UM MANO! BOA!

Foi com grande entusiasmo e excitação que o Manuel abraçou este projeto: foi à ecografia com a mãe, participou na escolha do nome do mano, ajudou os pais a ir buscar a sua roupa de bebé à arrecadação e selecioná-la por tamanhos… e foi aqui que começaram os problemas…

“Tão pequenino?! Não vai sequer ser capaz de pegar no comando da consola quanto mais jogar!”, “Uhm? Comer e dormir? É isso que eu posso esperar do mano? Não me parece muito…”, “Bem, há-de crescer… que seja rápido!”

O nascimento do mano aproximava-se e os preparativos sucediam-se a uma velocidade vertiginosa. A mãe andava cansada, já nunca brincava às escondidas e jogar à bola nem pensar. A família (crescidos) visitavam e traziam prendas para o bebé e iam dizendo:
“vais ter de ajudar a mãe…”, “tu já és crescido, e o bebé vai precisar muito da mãe e do pai…”, “depois tens de partilhar os teus brinquedos…”


“O quê? Não foi nada disto que combinámos! Então a ideia não era um mano para eu brincar? Agora é que me dizem que vai haver trabalho para mim, menos mãe e pai e ainda por cima menos brinquedos?!”

Vendo o Manuel entristecido a mãe foi falar com ele, que lhe explicou o que se passava e como andava preocupado. A mãe ouviu com atenção, e tranquilizou o Manuel explicando que era justo que se sentisse triste, confuso e cansado de todas estas mudanças e diligências. Se calhar precisava de mais tempo para estarem com ele…

Os pais sentaram-se os dois a pensar como poderiam ajudar o Manuel, e depois de recolherem conselhos e sugestões, lerem e pesquisarem chegaram a esta lista:

1.             Explicar o que pode o Manuel esperar do mano a cada momento do seu desenvolvimento;

2.             Explicar ao Manuel as necessidades do bebé e porque é que ele precisa tanto dos adultos;

3.             Explicar que é natural que os pais se sintam mais cansados;

4.             Combinar de que forma é que o Manuel também pode ajudar o bebé e os pais (ajudar a dar banho, a mudar as fraldas…);

5.             Fazer o Manuel sentir que ser o mais velho é um posto importante e não um castigo!;

6.             Elogiar e reforçar o Manuel por todos os comportamentos positivos!

7.             Combinar um tempo diário divertido só para o Manuel;

8.             Manter o mais possível as nossas rotinas e rituais de família (jantar juntos, ler uma história antes de dormir, jogar às escondidas!);

9.             Envolver o Manuel em todos os preparativos, pedir a sua opinião e validar os seus contributos;

10.          Ter em mente que o Manuel também precisa de tempo para falar só dele e das suas emoções, de fazer projectos só seus e em que nós estejamos envolvidos (sem bebé);

11.          Explicar que o amor de pais não se divide, multiplica-se!

ps: dizer ao Manuel que, afinal, é uma mana…


Helena Almeida, Psicóloga Clínica da Equipa Mindkiddo
(Mestrado Integrado em Psicologia – Área de Clínica, Instituto Superior de Psicologia Aplicada (2012); Licenciatura em Ensino Básico 1.º Ciclo, Escola Superior de Educação de Lisboa (2004)

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